Quando escrevo a palavra saga, afirmo que com certeza essa a primeira de muitas postagens que virão. Se você me perguntar o porquê, eu te responderei: - Grande parte das cenas de racismo mais fortes que eu presenciei na cidade onde vivo aconteceram dentro do ônibus coletivo.
Hoje ao retornar de um exame no SUS que não deu certo, pois havia faltado luz e água no hospital. O exame ficou marcado para daqui a um mês. Se eu tivesse que morrer, não esperaria mais um mês por um exame. Enfim, ao entrar no ônibus, dirigi-me para o fundo onde havia um assento desocupado ao lado de um adolescente negro. Logo ao sentar-me notei que ele estava acompanhado de um amigo, sentado na última fileira do ônibus e meu assento ficava na frente do dele. Logo notei que os dois começaram a sorrir quando me viram chegar e sentar, olhavam para mim e sorriam, disfarçando com brincadeirinhas e piadas sem nexo.
Eu fiquei calma, na medida do possível, pois sei que nessa idade tudo é motivo para piada. Os dois rapazes eram afrodescendentes e começaram a mexer com as pessoas que estavam fora do ônibus na calçada. De repente, eles viram um jovem negro do lado de fora e gritaram: - Ei nêgo feio!!! E deram gargalhadas. Depois um deles disse: -Ele é mais feio que o Pelé. O outro respondeu: -Parece um africano! deram mais gargalhadas. Depois um deles teve que descer do ônibus e se despediram sorrindo e se olhando.
Eu estava lendo um livro em que o autor fala sobre a identidade afrodescendente e a problemática da construção dessa identidade em um país como o Brasil, que vive o mito da democracia racial e não consegue enxergar que o racismo existe. Comecei a pensar nas inúmeras situações que presenciei no local onde vivo e cheguei a conclusão que aqui, pelo menos em comparação com os estados e países por onde passei, o racismo é muito forte.
Em Teresina, o racismo existe sim e você pode encontrá-lo de todas as formas: explícito, implícito e meio-termo. As pessoas te discriminam e ainda riem de você na sua cara. Algumas pessoas as vezes me dizem que eu vejo racismo em todo lugar, mas é verdade, ele está em todo lugar, só muda de receptor e destinatário.
No interior do estado, a discriminação racial pode ser ainda bem pior, pois se existe aqui na capital, onde as pessoas ainda podem encontrar mais pessoas que assumem sua identidade afrodescendente, imagine no interior, onde as pessoas têm a mente mais fechada e estão mais presas na tradição do preconceito descarado, em forma de piadas e musiquinhas preconceituosas.
Outro dia, dentro do ônibus novamente, eu me sentei do lado da janela e a cadeira ao lado ficou vazia. Duas mulheres aparentemente brancas passaram a catraca e foram até o local em que eu estava sentada e uma delas ocupou o assento ao meu lado. Só que ela se esqueceu de olhar primeiramente para mim antes de se sentar. Quando de repente ela olhou para o lado e fez uma cara de espanto, olhou para a outra mulher que esta próxima a ela em pé com um semblante assustado e levantou-se da cadeira. Eu fiquei olhando para ela, que me ignorou, nem sequer teve coragem de olhar para mim. Fez uma cara de nojo e seguiu todo o trajeto em pé. Logo depois sentou-se ao meu lado uma mulher com características afrodescendentes, e a viagem transcorreu normal até o seu destino.
Eu, calada estava e assim permaneci, refletindo sobre o significado deste episódio em minha vida. Lembrei da África do Sul na época do Apartheid, senti-me lá. Como é triste conviver no século XXI com pessoas que tem a mente situada na época da escravidão. Um amigo meu estrangeiro em visita ao Piauí, neste ano, disse-me que as pessoas daqui tinham uma mentalidade parecida com a dos Estados Unidos no século XIX.
Vou terminando por aqui, preciso pensar mais sobre o assunto, ler mais sobre o assunto e quem sabe ler um romance estadunidense do século XIX para tentar entender como funciona o racismo por aqui. Mas, não posso deixar de considerar que vivemos no século XXI em um "país tropical, abençoado por Deus", segundo Jorge Ben. Aqui não existe "racismo", pois somos a mais bela miscigenação do mundo: a das três raças.....hahahahha... Que piada!
Preta Lu
28/08/2013

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